Problemas em torno do Ensino Médio
- Alexsandro Alves de Araujo
- 21 de mai.
- 6 min de leitura
Mestrado Profissional de Sociologia em Rede Nacional (PROFSOCIO): disciplina de Sociologia da Educação. Discente: Profa. Dra. Darcilene Cláudio Gomes
Alexsandro Araujo

O ensino médio brasileiro enfrenta inúmeros desafios, sobretudo no contexto da implementação do Novo Ensino Médio (NEM), instituído pela Lei nº 13.415/2017. Embora tenha sido apresentado como uma proposta inovadora para elevar a qualidade da educação, o NEM gerou contradições significativas que afetam diretamente a prática docente e a inclusão social dos estudantes.
A proposta do NEM introduziu itinerários formativos e disciplinas eletivas com o objetivo de flexibilizar o currículo. No entanto, como aponta Freitas (2022), essas mudanças se alinham a reformas de cunho empresarial, que priorizam interesses tecnicistas e mercadológicos em detrimento de uma formação crítica e cidadã.

Como resultado, a redução da carga horária de disciplinas fundamentais como a Sociologia, compromete a capacidade dos jovens de compreender e questionar as estruturas sociais, políticas e econômicas que moldam suas vidas. Nas escolas particulares, essas alterações foram absorvidas com maior facilidade, o que amplia ainda mais as desigualdades no acesso ao Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
A precarização do trabalho docente constitui outro entrave crítico. A prática recorrente da contratação temporária, sem garantias de estabilidade, compromete o planejamento pedagógico e fragiliza a autonomia docente. Freitas (2022) adverte que a lógica de gestão tecnicista transforma o professor em mero executor de um currículo imposto, minando sua capacidade crítica e criativa.
Percentual de Professores Temporários em Pernambuco
Rede Estadual: Segundo dados do Censo Escolar 2023, aproximadamente 62,5% dos professores da rede estadual são temporários, enquanto 36,3% são efetivos. Redes Municipais: Em 2023, cerca de 50,1% dos professores nas escolas públicas municipais de Pernambuco eram contratados temporariamente, e 48,7% eram efetivos.
A terceirização e a rotatividade de profissionais, observadas em diversos estados, demonstram a falta de concursos públicos regulares.
O Relatório da Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ, 2020), aponta que, em Alagoas, apenas 74% dos docentes atuam no setor público, enquanto no Maranhão esse índice chega a 88,9%, revelando disparidades na atuação estatal. A estabilidade no cargo atinge apenas 66% dos professores no Nordeste, o que compromete a continuidade e a qualidade da educação.
A situação varia entre os estados nordestinos de acordo com o relatório:
O Ceará, por exemplo, apresentou um crescimento expressivo de 21,3% no quadro docente, indicando expansão e investimento. Já Pernambuco registrou uma queda de 11,3%, sugerindo falhas nas políticas de contratação ou evasão de profissionais (FUNDAJ, 2020, p. 27).
A sobrecarga dos professores e a escassez de recursos pedagógicos tornam-se ainda mais críticas em regiões marcadas por desigualdades, como o Nordeste, onde as desigualdades são mais evidentes. O relatório mostra que essas novas exigências de gestões tecnicistas ampliam a sobrecarga docente sem oferecer os recursos necessários, tanto para os docentes quanto para os discentes.
A contratação temporária tem sido utilizada em vários estados e municípios no Brasil, pois permite adequar o quadro de professores à disponibilidade orçamentária, liberando recursos para outras políticas de interesse dos gestores. A flexibilização da estabilidade e a possibilidade de regimes jurídicos diferenciados, todavia, são associadas à precarização dos vínculos e ao acesso a um menor conjunto de direitos (previdenciários, por exemplo). Relatório da FUNDAJ (2020, Pg. 35).
O grande problema de ter uma grande quantidade de professores contratados em detrimento de concursados efetivos é que isso gera instabilidade na educação, na qualidade do trabalho e no compromisso por parte do professor, independente da vontade que ele tenha para trabalhar a situação de vulnerabilidade contratual não permite um planejamento a longo prazo.
Outro aspecto preocupante diz respeito à formação dos docentes: apenas 47,2% possuem formação específica na disciplina que lecionam, agravando a desigualdade na qualidade do ensino, especialmente nas classes populares.
Segundo levantamento divulgado em fevereiro de 2025, aproximadamente 95% dos professores de Sociologia e Filosofia e 97% dos de Artes na rede estadual de Pernambuco estão atuando fora de suas áreas de formação. Essa situação foi denunciada por docentes ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE), que agendou uma audiência pública para discutir o problema. Além disso, uma pesquisa publicada na Revista Semiárido De Visu revelou que, em disciplinas como Artes, Física, Sociologia e Filosofia, o percentual de adequação docente é inferior a 10%, ou seja, a grande maioria dos professores dessas disciplinas na rede estadual possui formação em outras áreas do conhecimento. (Censo Escolar 2024).

De acordo com o relatório da FUNDAJ (2020), embora 27% da população nordestina resida em zonas rurais em 2010, apenas 7% dos profissionais da docência estavam atuando nessas regiões. Estados como Ceará apresentaram os menores índices de presença docente em áreas rurais (2,1%), por outro lado, o Maranhão mostrou maior presença docente nas zonas rurais (18,5%), embora ainda insuficiente para atender às necessidades da população. Essa disparidade demonstrou grandes desafios.

Ou seja, um dos principais problemas no ensino médio também tem se tornado a questão da falta de condições por parte dos governos para auxiliar os professores, o que acaba aumentando ainda mais a desigualdade social entre os estudantes do Nordeste em relação ao restante nacional.
Segundo Bourdieu (2014), o "capital cultural" desempenha um papel central na perpetuação dessas desigualdades. Estudantes de classes menos favorecidas também enfrentam dificuldades adicionais devido à falta de familiaridade com o habitus acadêmico, que privilegia aqueles provenientes de famílias com maior capital cultural e que residem nos grandes centros urbanos.
A política educacional, ao tratar todos os estudantes como iguais, ignora desigualdades regionais, sociais e culturais, reforçando a violência simbólica no ambiente escolar.
Segundo Nogueira e Nogueira (2002), a linguagem escolar frequentemente se distancia da realidade dos alunos de baixa renda, criando barreiras adicionais à aprendizagem.
Nesse caso, a lógica da proposta de igualdade nas escolas não se aplica de forma homogênea para todos os estudantes nos mais diversos Estados do Brasil. Além disso, por exemplo, o Governo faz a entrega do material didático, entretanto, nem todos os alunos tem recursos em casa para continuar estudando, como é o caso de precisar de internet para fazer pesquisas e consultas para complementar a aprendizagem, ou um ambiente seguro e acolhedor com higiene e todas as refeições necessárias, condução etc. Isso nas capitais e se agravando mais ainda nas áreas rurais.

Essa lógica apenas tem reforçado a violência simbólica presente no ambiente escolar, que, ao tratar todos os estudantes como iguais, ignora as diferenças de contexto regional, social e cultural e acaba legitimando as desigualdades por meio das notas. De acordo com Nogueira e Nogueira (2002), a linguagem escolar muitas vezes também se distancia da realidade dos estudantes menos favorecidos, criando barreiras adicionais para a aprendizagem.
De acordo com o relatório da FUNDAJ (2020), nos estados da Paraíba, Alagoas e Sergipe, a oferta de ensino médio em zonas rurais é responsabilidade quase exclusiva das escolas públicas, que operam com 100% de atuação nessas regiões. Isso evidencia a necessidade de políticas específicas para essas localidades.
Diante dos fatos, os problemas enfrentados pelo Ensino Médio brasileiro não podem ser resolvidos com soluções simples ou alinhadas a interesses mercadológicos. Tampouco existe uma panaceia para resolver todos os problemas enfrentados no âmbito educacional. O que podemos ressaltar é que se faz necessária a participação de todos os interessados em torno da educação como as famílias, os estudantes, professores, gestores e todos a quem interessar.
A educação vai se mostra mais eficaz se atuar e existir de forma democrática e inclusiva para reduzir as desigualdades regionais, municipais, estaduais agindo de forma nacional.
Também, se faz necessária a implementação da valorização da docência em se tratando da necessidade de transformação por meio do ensino e da educação no Brasil, como também, o aumento de incentivos para docentes atuarem em áreas rurais, ampliação de concursos públicos para fomentar a melhora na qualidade da educação e o comprometimento dos professores em vez de gerar instabilidade na educação. Todos esses problemas merecem uma atenção adequada por parte dos governos, Federal, Estadual e Municipal para que aconteçam mudanças significativas na educação.
REFERÊNCIAS
ARROYO, M. Currículo, território em disputa. Petrópolis: Vozes, 2013.
BOURDIEU, P. A reprodução. Rio de Janeiro: Vozes, 2014.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
FREITAS, L. C. A reforma empresarial da educação: nova direita, velhas ideias. São Paulo: Expressão Popular, 2022.
FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO (FUNDAJ). Ensino Médio no Nordeste: desafios à qualificação do trabalho docente. Recife: Editora Massangana, 2020.
HOOKS, B. Ensinando a transgredir: A educação como prática da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2013.
NOGUEIRA, C. M.; NOGUEIRA, M. A. A sociologia da educação de Pierre Bourdieu: limites e contribuições. Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 78, p. 35-52, 2002.
Dados da Rede Estadual (contratações temporárias):
SILVA, Margarida A. Pernambuco está entre os estados que aumentaram as contratações temporárias para o cargo de professor nos últimos dez anos. Jornal do Commercio, Recife, 25 abr. 2024. Disponível em: https://jc.uol.com.br/colunas/enem-e-educacao/2024/04/25/pernambuco-esta-entre-os-estados-que-aumentaram-as-contratacoes-temporarias-para-o-cargo-de-professor-nos-ultimos-dez-anos.html. Acesso em: 21 maio 2025.
Dados das Redes Municipais (Censo Escolar 2024):
SILVA, Margarida A. Censo Escolar 2024: Pernambuco tem mais professores temporários do que concursados nas redes estadual e municipal. Jornal do Commercio, Recife, 14 abr. 2025. Disponível em: https://jc.uol.com.br/colunas/enem-e-educacao/2025/04/14/censo-escolar-2024-pernambuco-tem-mais-professores-temporarios-do-que-concursados-nas-redes-estadual-e-municipal.html. Acesso em: 21 maio 2025.
Determinação do TCE-PE (restrição de contratações):
JUNIOR CAMPOS. Mais de 60% dos professores de PE são temporários; TCE proíbe novas contratações. Júnior Campos, 18 abr. 2024. Disponível em: https://juniorcampos.net/cotidiano/mais-de-60-dos-professores-de-pe-sao-temporarios-tce-proibe-novas-contratacoes. Acesso em: 21 maio 2025.
ARAÚJO, Mirella. Professores denunciam ao MPPE desvio de função em disciplinas especializadas na rede estadual de Pernambuco. Jornal do Commercio, Recife, 10 fev. 2025. Disponível em: https://jc.uol.com.br/colunas/enem-e-educacao/2025/02/10/professores-denunciam-ao-mppe-desvio-de-funcao-em-disciplinas-especializadas-na-rede-estadual-de-pernambuco.html. Acesso em: 21 maio 2025.
FARIAS, Cristiane Leal Rodrigues de; ALVES, Patrícia Formiga Maciel. A educação pernambucana em números: notas sobre docências de Ensino Médio na rede estadual. Revista Semiárido De Visu, v. 13, n. 1, 2023. Disponível em: https://semiaridodevisu.ifsertaope.edu.br/index.php/rsdv/article/view/1247. Acesso em: 21 maio 2025.
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